Hay que resistir sin perder a alegria de viver, como ensinou o poeta
- Pablo Pereira
- 20 de fev.
- 2 min de leitura
Atualizado: 11 de abr.
Há um poema do grande Thiago de Mello que, para mim, funciona como um bálsamo para as angústias do cotidiano. "Faz escuro, mas eu canto", escreveu o poeta (veja a íntegra abaixo). É um sublime apelo à resistência. Thiago viveu exilado no Chile nos tempos da ditadura dos anos 60/70, de onde acompanhou, sofrendo, a destruição da frágil democracia brasileira daquela época. Hoje, com a Constituição de 1988 sendo Guia do Judiciário e tendo sobrevivido às ameaças das bestas que voltaram a rondar o País, lembro sempre da mensagem do poema de Thiago. "Vale a pena não dormir para esperar/a cor do mundo mudar".
Tive o privilégio de estar com esse artista em Barreirinha, na beira do rio Amazonas, onde ele morava numa casa projetada pelo arquiteto Lúcio Costa (1902-1998), o famoso companheiro do genial Oscar Niemeyer (1907-2012). Thiago nasceu em Barreirinha em 1926. Quando morreu, em janeiro de 2022, tinha 95 anos. Nosso encontro ocorreu em 1997. Ele havia reproduzido a mesma planta da casa na Freguesia do Andirá, na margem do rio de mesmo nome, que fica a cerca de meia hora de "voadeira", a lancha da região, da sede do município.
Naquela viagem, cujo destino era Parintins, onde a seca amazônica era mais forte - e que rendeu uma reportagem de página inteira (cópia abaixo) -, encontrei Thiago no avião. Na hora, mudei o rumo da história. Fui com o colega fotógrafo César Araújo seguir o caminho do poeta das águas, de lancha, pelo paraná do Ramos. Estivemos até no quintal do poeta, onde ele batia longos papos com um amigo especial, que o visitava pela manhã: um tucano chamado Flor da Mata. A ave ia ali se alimentar de frutas. gentilmente oferecidas a ele pelo poeta, desde filhote. Thiago curtia as visitas do pássaro.
Naqueles dias secos de novembro, Thiago nos fez o convite para conhecermos a morada da Freguesia, onde se isolava do mundo para descansar e escrever. Hoje é um prédio abandonado, quase em ruínas. Lá, depois de uma longa conversa/entrevista na varanda, de frente para a praia, para meu espanto, ele pediu o bloquinho que eu usava para anotações, destacou uma folhinha, escreveu uma dedicatória - e desenhou na borda o que aparecia diante de nós: a mata na outra margem do rio Andirá. Guardo essa gentileza do escritor como relíquia da minha vida de repórter. Viva a alegria!



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